Instante
Já há tempos que minha sabedoria se reúne como uma nuvem, ela fica mais silenciosa e escura. Assim ocorre com toda sabedoria que deve um dia dar luz a raios. –
Não quero ser, nem quero valer como luz a esses homens de hoje. Eles – quero cegar: raio de minha sabedoria! Perfura-lhes os olhos! (NIETZSCHE. Assim Falou Zaratustra. Porto Alegre: L&PM, 2019, p. 275).
Miguel Chikaoka, Hagakure, 2003
“Olha este portal! Anão!”, segui falando: “Ele tem duas faces. Dois caminhos unem-se aqui. Ninguém jamais os percorreu até o final.
“Esta longa estrada para trás: ela dura uma eternidade. E aquela longa estrada para além – é outra eternidade.
“Eles se contradizem, estes caminhos; chocam-se diretamente, cabeça contra cabeça: e é aqui, neste portal, que se encontram. O nome do portal está escrito acima: ‘Instante’.
“Mas se alguém seguisse por um deles – cada vez mais longe, cada vez mais além: crês, anão, que estes caminhos se contradizem eternamente?” –
“Tudo que é reto mente”, murmurou desdenhoso o anão. “Toda verdade é torna, o próprio tempo é um círculo.”
“Espírito do peso!”, disse eu, irado. “Não o tornes demasiado simples! Senão te deixo acocorado aí, onde estás, coxo – e fui eu quem te carreguei para cima!
“Olha”, segui falando, “olha este instante Deste portal Instante parte uma estrada longa e eterna para trás: há atrás de nós uma eternidade.
“Não é preciso que tudo aquilo que pode caminhar já tenha trilhado alguma vez esta estrada? Não é preciso que, de todas as coisas, aquilo que pode ocorrer já tenha alguma vez ocorrido, agido, passado?
“E se tudo já existiu: que pensas tu, anão, deste instante? Não é preciso que também este portal – já tenha existido?
“E não estão todas as coisas atadas com tal firmeza que este instante puxa atrás de si todas as coisas vindouras? Logo – também a si mesmo?
“Pois tudo aquilo que pode caminhar: também por esta longa estrada para além – precisa mais uma vez ainda caminhar! – (NIETZSCHE. Assim Falou Zaratustra. Porto Alegre: L&PM, 2019, p. 154).
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